Rodovia BR-319 é verdadeira aventura no coração da Amazônia

Rodar entre Porto Velho (RO) e Manaus (AM) não é lá o que se pode chamar de turismo. Em uma rota a trabalho saindo de São Paulo e percorrendo vários estados do Brasil, fiz esse roteiro em uma rodovia que de fato não pode ser chamada de rodovia, mas um caminho no meio da selva que é mantido ativo pelo vai e vem constante de pessoas que passam ali por necessidade.

Junho do ano passado, período em que as chuvas na região da Amazônia já são mais raras e portanto o caminho se torna mais trafegável. São 800 quilômetros em uma viagem prevista de 20 horas, mas que dependendo de como estiver a estrada pode ser feita em 20, 30… até 40 horas. Fiz o roteiro com mais três pessoas. Nosso veículo: uma picape 4×4.

Mas, o que é a rodovia BR-319? É rodovia construída na década de 70 e que já teve asfalto em parte de seu trajeto. O asfalto foi engolido pelo solo irregular e pelo descuido do governo no passar dos anos. A rodovia é excelente nos primeiros 190 quilômetros, que foram reformados anos atrás. Quando ela encontra a Transamazônica, na cidade de Humaitá, começa o caos.

BR319 no mapa do Brasil: 800 quilômetros – a maior parte de terra (Imagem: Google Maps)

No caminho da BR319 é possível encontrar muito do que é listado como problema para a Amazônia. No trecho de Humaitá até Manaus a rodovia é cercada de floresta dos dois lados, mas há longos trechos de margem desmatada e não é difícil ver a ação de madeireiros ao longo do trecho.

PRF: o único posto está no cruzamento da BR-319 com a Transamazônica. Nos 700 quilômetros restantes pela floresta não há posto, nem encontramos qualquer viatura.

No caminho os postos de parada são escassos. Por exemplo, no começo do caminho há um distrito chamado Realidade. A gasolina disponível é vendida a mais de R$ 5, o litro, e o posto é uma casa improvisada. Este também é um ponto de parada para comer – param por lá os ônibus – com comida caseira e barata, em contraponto ao combustível.

Quando chegamos nesse distrito era fim de semana e estava passando na TV um jogo de futebol. No bar ao lado do posto, pessoas armadas assistindo ao jogo. Na rua em frente, que é a própria rodovia, motociclistas sem capacete e carros sem placa. É um local onde não há barreira entre a legalidade ou a ilegalidade. Também não há simpatia por visitantes, é de fato um local de passagem.

Com pouca chuva o caminho já começa a piorar (Foto: Renato Fonseca/ Mundo Mochila)

Saindo de Realidade, a nova realidade: chuva e barro na estrada. Foi a primeira de 8 paradas. Nesses pontos de atoleiro ficam vários caminhões e até ônibus que ficam parados por horas esperando um reboque ou outra ajuda. Quem fica tem que contar com a ajuda de quem chega: seja ajudando no reboque ou apenas deixando uma comida para quem está com fome.

E nestes pontos, de atoleiro, têm de tudo. Tem idoso que está voltando para casa, tem venezuelano em busca de oportunidade no Brasil, tem caminhoneiro, tem jipeiro, tem ônibus de linha, tem barro, muito barro.

Trecho de atoleiro da BR-319, em 2019

Caminho sem fim

A BR-319 é o único caminho rodoviário que liga Manaus ao restante do país. Porém não é um caminho movimentado. A maioria dos caminhões que sai com produtos de Manaus segue para o restante do país por balsa, pelos rios Amazonas e Madeira.

A rodovia foi aberta durante o governo militar e foi sendo abandonada no mesmo período. No final da década de 80 ela ficou intrafegável devido a destruição das chuvas e a floresta avançando sobre as áreas onde havia asfalto.

A rodovia foi parcialmente recuperada pelo Governo Federal em 2007, quando o Exército asfaltou o trecho que citamos no começo da reportagem, entre Porto Velho e Humaitá, e recuperou alguns poucos trechos onde até o caminho de terra havia sumido.

Desde 1998 vários projetos foram debatidos para o asfaltamento de outros trechos da rodovia, mas houve vários impedimentos, como a não concordância de órgãos ambientais.

Para quem já trafegou pela rodovia, é possível elencar vários pontos prós e contra o asfaltamento da 319. Entre os principais: o asfaltamento vai facilitar a vida de quem vive por ali e vai dar opção para quem hoje precisa pagar (caro) pelo serviço de balsa pelo rio. E o contra é que levar desenvolvimento para a floresta vai acabar favorecendo ações ilegais de madeireiros, por exemplo, que hoje, com estrada ruim, já é intenso.

Durante o trajeto, as paisagens são muito contrastantes. Desde a situação onde a floresta é fechada onde ouve-se apenas o barulho do vento e dos pássaros, passando por trechos onde é evidente a ação de desmatamento à margem da rodovia e chegando a cenários muito bonitos, como o trecho de balsa já na parte final da rodovia para quem está seguindo sentido Manaus.

Levamos quase 40 horas para atravessar a rodovia após parar por oito atoleiros, em período dado como “seco” no Amazonas. O trecho dos 200 quilômetros finais rumo a Manaus é bem mais tranquilo. A BR-319 ainda é uma aventura com riscos reais.

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